sábado, 31 de março de 2012

Vazio de Vinícius de Moraes

A noite é como um olhar longo e claro de mulher. 
Sinto-me só. 
Em todas as coisas que me rodeiam 
Há um desconhecimento completo da minha infelicidade. 
A noite alta me espia pela janela 
E eu, desamparado de tudo, desamparado de mim próprio 
Olho as coisas em torno 
Com um desconhecimento completo das coisas que me rodeiam. 
Vago em mim mesmo, sozinho, perdido 
Tudo é deserto, minha alma é vazia 
E tem o silêncio grave dos templos abandonados. 
Eu espio a noite pela janela 
Ela tem a quietação maravilhosa do êxtase. 
Mas os gatos embaixo me acordam gritando luxúrias 
E eu penso que amanhã… 
Mas a gata vê na rua um gato preto e grande 
E foge do gato cinzento. 
Eu espio a noite maravilhosa 
Estranha como um olhar de carne. 
Vejo na grade o gato cinzento olhando os amores da gata e do gato preto 
Perco-me por momentos em antigas aventuras 
E volto à alma vazia e silenciosa que não acorda mais 
Nem à noite clara e longa como um olhar de mulher 
Nem aos gritos luxuriosos dos gatos se amando na rua.




Nenhum comentário: